Moro no trigésimo andar, que
rua estreita separa dos edifícios do outro lado. Sinto‑me mais próximo do
vizinho da frente que das pessoas que vejo na rua, do tamanho de formigas.
De há meses para cá
comecei a seguir com atenção a vida do casal em frente. Talvez porque me vi
sozinho - a mulher revolveu “dar um
tempo” e foi para casa da mãe, ou porque a mulher do meu vizinho era uma loura lindíssima
com um riso alegre que adivinhava ou conseguia até escutar nos dias de calor.
Apercebi-me de que também
discutiam com reconciliações apaixonadas, da sala iriam para o quarto, deixando
eu de os ver, mas adivinhando o que se seguiria.
No entanto, a última
discussão foi diferente. Gritavam um com o outro e ele cresceu para ela.
Acreditei que a iria agredir quando tive de responder ao bater incessante à
minha porta. Era a entrega de uma encomenda. Assinei e corri de volta para a
janela.
Já não os vi. Era
impossível que tão depressa pudessem ter passado da discussão para a
reconciliação.
Continuei atento e cada
vez mais preocupado. Voltei a vê-lo a ele, na sala. Jantava com a televisão ligada
e apagava a luz quando se ia deitar. Mas ela, nada. Nunca mais ouvi o riso
alegre.
Ontem, já tarde, vejo-o a
vir do quarto com um volume pesado e depois na rua a puxar o tal volume para o carro
estacionado perto.
Liguei à Polícia e contei-lhes
que acabara de ver: o vizinho a levar o cadáver da esposa para o carro. Vi-os
chegar. Rodearem-no. Abriram a mala do carro e subiram.
Lá dentro apareceu a
loura de roupão com ar engripado. Estava viva!
O agente apontou pela janela
e os três olharam para mim.
Pondero agora mudar-me
para casa de sogra
Rear Window, de Hitchcock, viu?
ResponderEliminarBeijinhos
Vi, adorei e lembrei-me do filme para escrever este texto :)
Eliminarum beijinho
Gostei muito
ResponderEliminarTodos nós temos (mais ou menos activo) um lado voyeur.
As janelas é que variam, geralmente não as do vizinho, mas os livros, os jornais, há sempre uma curiosidade sobre como o outro vive e pensa.
E colocaste uma nota leve sobre a angústia que nos assalta a todos.
Parabéns!
Obrigada Boop :)
EliminarTipo Janela Indiscreta mas com um final menos dramático!
ResponderEliminarAbraço
Foi no que pensei :)
Eliminarum abraço
Eu contei algo parecido, mas no texto
ResponderEliminareu dizia de um marido ciumento que achou
que a mulher o traia porque viu seu carro
adentrando ao motel quando na verdade era
o irmão dela a quem emprestara o veículo.
Adorei a escrita, não a minha, mas esta, a
sua. (rs)
Um abração sem confusão.
Será que também está no mesmo Desafio de Escrita?
EliminarE onde poderei ler o seu texto?
um abraço
Por vezes as aparências enganam.
ResponderEliminarGostei da história, que tem uma boa narrativa.
Continuação de boa semana.
Abraço.
Obrigada :)
Eliminarum abraço
Nem sempre o que parece é.
ResponderEliminarGostei muito desta história que poderia ser real.
Beijos Gábi
Obrigada Manu
Eliminarum beijinho
Que história tão envolvente.
ResponderEliminarDa minha janela vejo caixinhas de fósforos e vizinhos na sua vida fútil.
Um grande sorriso de luz.
Megy Maia
Obrigada Magy Maia e um grande sorriso de luz também :)
EliminarHahahah, agora vai ser ao contrário? Adorei este conto! Venham mais!:)
ResponderEliminar-
Arrepiam-me tuas palavras saídas d'alma.
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Beijo e uma excelente noite!
Muito obrigada Cidália Ferreira
Eliminarum beijinho e uma excelente noite também