Era tão tarde que até os
pais se tinham deitado.
Tudo estava escuro, mas
parecia que a casa respirava. Talvez ao ritmo da respiração dos pais que
dormiam no quarto ao lado.
Tinha calor e mandou o
cobertor para baixo. Logo a seguir teve frio. Ergueu-se. Respirou o escuro e o
frio do quarto que arrefecia. Virou as pernas para o lado, e com um salto
acertou no tapete, também frio.
Algo estava errado. Só
não sabia bem o quê.
Tinha quase a certeza que
se andasse três passos chegaria à porta do quarto, que deveria estar
entreaberta, mais alguns passos e chegaria ao quarto dos pais. Sem conseguir
ver nada receava dar um primeiro passo e cair num buraco.
Na última vez em que
acordara de noite e fora ao quarto deles não correra bem. O pai zangara-se. Com
uma voz séria avisara que ele tinha de se habituar a dormir no seu quarto,
sobretudo agora que a mãe tinha de descansar. A mãe não dissera nada. Olhara
para ele com o olhar triste que agora usava quase sempre. Era mais por isso que
não devia ir lá, para que a mãe dormisse e deixasse de estar triste.
Estava com frio e
sozinho. Ou não estaria?
Em frente, no caixote dos
brinquedos, um olhar brilhava e fixara-se nele.
A curiosidade venceu o
medo e pé ante pé aproximou-se.
Uma vozinha segredou
então:
- Lembras-te de mim?
Respondeu-lhe também
baixinho: “Não”, mas mudou para: “Não sei”. Havia algo de familiar nos olhos e
na voz. Chegou-se mais perto, estendeu a mão e tocou-lhe. Reconheceu-o pelo
tacto. O seu ursinho de peluche, esquecido há tanto tempo.
- O pai não te deitou
fora?
- Escondi-me e agora voltei.
Os dois foram para a sua
cama. Aqueceram-se um ao outro e adormeceu.
Às vezes a fantasia da criança é o aconchego que não consegue junto aos pais.
ResponderEliminarBeijocas.