Mãe queria tanto estar
contigo agora.
Nos meus sonhos estamos
juntos, vejo-te mais jovem, viva, com a doçura que era só tua.
Queria não te
decepcionar, mas agora só queria aninhar-me no teu colo, ser de novo pequeno,
ter-te a ti, ao meu lado.
Sei que em mim vias o
que mais ninguém vê.
Sei que adivinhavas
quando eu não estava bem, sei que sabes do meu medo.
E se esta for a última
carta que escrevo será pelo menos uma carta verdadeira.
Não sei como me meti
nisto, nesta guerra longe, em terras de deserto e estranhos que nos odeiam. Afundo-me
neste calor húmido as vinte e quatro horas do dia. O cheiro a latrinas e suor
cerca-me. Há areia por todo o lado, na roupa, na comida, no ar. Às vezes penso
que não consigo respirar.
Andamos todos estoirados,
mas quando é para sairmos em acção, a adrenalina dispara e fazemos o que
esperam de nós, aquilo para que fomos treinados. Todos sabemos que se hesitarmos
isso pode custar-nos a vida. Faço por não pensar no que ando aqui a fazer, adio
essa reflexão para quando sair disto, se sair disto.
Mãe, fui estúpido,
pensei no exército como uma carreira, enganei-me com a história da honra de
defender a pátria, queria encontrar um lugar onde pudesse sentir que pertencia
e fui meter-me nisto.
Escrevo uma carta que
não posso enviar-te, imagino que ainda assim poderás lê‑la.
Se morrer o que ficará
de mim?
Não fiz nada, não
escrevi um livro, não tive um filho, nem plantei uma árvore.
Além de ti, ninguém sentirá
a minha falta, nem se irão lembrar dos aniversários, do meu nascimento e da
minha morte.
Tenho de terminar aqui,
ir para a missão que pode ser sem regresso.
Mas se morrer irei ter
contigo.
Muito bom. Um desespero uma sensação sentida por milhares de homens ao longo dos séculos.
ResponderEliminarAbraço