domingo, agosto 23, 2015

Post 5033 A lição de piano - 1ª tentativa

Quando era criança, o seu pai ganhou num jogo de cartas um piano velho. Eufórico exigiu a entrega do prémio que chegou dias depois quando a alegria do pai tinha começado a desaparecer, especialmente no confronto com a sua mãe que não estava de todo contente com a nova aquisição. Teve de entrar pela janela, felizmente moravam num rés-do-chão, por não caber pela entrada estreita do prédio, e foi instalado na sala. Arranharam as teclas, detectando as desafinadas, colocaram-lhe naperons e retratos em cima, e foram esquecendo-se dele.
Um belo dia, era já ele adulto e tinham os pais ido de férias para a aldeia, calhou reparar com outros olhos no piano. Imaginou-se a tocar grandes músicas e a ser o centro das atenções em concertos e festas. Decidiu: ia aprender a tocar piano.
Foi até ao Conservatório para se inteirar dos procedimentos. Estavam também de férias, mas havia anúncios de aulas particulares e anotou alguns. Ligou para o primeiro número que era de uma professora. Gostou da voz dela, soou-lhe musical, e marcaram uma aula na casa dela.
Conhecia a rua e chegou bem cedo. Gastou algum tempo no café da esquina até reunir toda a coragem necessária para vencer a sua timidez, e lá foi tocar-lhe à porta. Foi a própria que o atendeu e não correspondia bem à ideia que tinha feito. Em vez de uma jovem era uma mulher de trinta anos, bonita e muito pintada, com cabelo azul, camisa laranja, saia vermelha e sandálias douradas. Apesar das mãos bonitas, com dedos finos, tinha umas unhas compridas, pintadas de castanho, que lhe lembraram garras.
Conduziu-o a um quarto pequeno onde apenas cabiam o piano, dois bancos e uma pequena estante com livros e partituras musicais. Inquiriu-o sobre os seus conhecimentos que eram muito básicos – na iniciação musical apenas aprendera a ler pautas e a tocar (mal) a flauta de bisel.
Resolveu a professora começar a aula tocando uma música simples, mas o que ouviu foram as suas unhas sobre as teclas como castanholas
Não queria melindrar a professora, nem desistir das aulas.
Pensou e percebeu o que tinha de fazer.
Teve de procurar em várias lojas até conseguir encontrar meias de nylon finíssimas que fez questão de oferecer-lhe e pedir-lhe que as usasse, antes da segunda aula.
No dia marcado, a professora aguardava-o com as suas roupas coloridas, as meias, sem malhas e as unhas cortadas. 

6 comentários:


  1. :)

    Eu sempre quis aprender piano... mas na escola de música só havia vaga para acordeão.
    Fiquei com ela e por algum tempo aprendi solfejo, tive aulas teóricas e práticas... mas o meu pai nunca me comprou o acordeão que eu tanto queria.

    (e sim, unhas cortadas rentes é imperativo!)

    Beijinhos solfejados
    (^^)

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  2. Cheguei a ter aulas de piano (poucas) e além do piano andei a "arranhar" outros instrumentos, embora acordeão, não :)
    um beijinho solfejado também (isso é que imaginação)
    Gábi

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  3. Quando era adolescente e jovem adulta sonhava saber tocar piano para os momentos melancólicos.
    Tenho um piano alto. Os meus filhos sabem tocar piano. Eu... ainda não sei ao fim de tantos anos. Não tenho muito ouvido para a música, não quero tirar lições; o que eu gostaria era de ter uma varinha de condão que me fizesse ser minimamente boa no piano para conseguir “produzir” algo melodioso mesmo que simples.
    : )

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  4. Unhas e piano são, de fato,incompatíveis. Gostei do texto :)

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  5. Talvez experimentar umas aulas particulares, Catarina, com um bom professor pode ser bem interessante (eu tive umas aulas quando tive 15 anos e lembro-me de como gostava de aprender músicas fáceis)


    Obrigada Miss Smile :)



    Também, Jorge :)

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