Tinha onze anos, mal acabaram as aulas, saí da escola, pasta ao ombro com os livros e cadernos, ia para paragem esperar pelo trólei ou camioneta e regressar a casa.
Era quinta-feira e estávamos rodeados por barracas da
feira, vendedores e muitos clientes, pregões, palavrões, gritos e animação.
Os transportes demoravam a chegar pois tinham de
atravessar o mar de gente e partiam cheios.
Chocava-me ver as redondas mães de família carregadas
de cestos e sacos, que criticavam a canalhada por não respeitarem a fila, enquanto,
quase ao mesmo tempo, me passavam à frente, como se além de magrizela fosse
invisível. Não me respeitavam a mim!
Reparei numa mãe que perguntava ao filho de três anos
que levava ao colo:
- Queres uma bola de Berlim?
Ele ficou super feliz e acenou que sim, mas a animação
apagou-se quando percebeu que se tratava de um bolo e não de uma bola de jogar.
Entretanto, chegou um trólei. Miúdos e senhoras
atropelaram-se em funil para a porta. Conseguiu entrar, meio empurrada pelos
que vinham atrás. Pelo menos, em dias assim não tinha de me preocupar em
agarrar-me aos bancos ou argolas do tecto, porque era sustentada pelos que
estavam à minha volta.
Aproximava-se a minha paragem.
- “Com licença, com licença” dirigi aos que me
rodeavam, mas só cheguei à saída quando arrancava e se ia fechar a porta.
Pensei: Salto ou não salto? Saltei.
E caí.
O condutor, que então parou, perguntou-me muito sério e
meio zangado:
- Não te magoaste?
Enquanto rápida e envergonhadamente me levantava
(parecera fácil quando eram outros a fazê-lo) respondi: Não me magoei.
- Em vez de saltares porque não disseste para parar?
Não disse nada, mas pensei para mim, e quem me ouvia?
Com o resto da dignidade que ainda tinha, corri para
casa.
E houve um que ficou preso na porta do autocarro e desceu parta da Avenida a pé coxinho.
ResponderEliminarQuem terá sido??????
Eis uma coisa que nunca fiz. Na minha infância não haviam autocarros nem tróleis nem qualquer outro transporte na minha zona, que não fossem as pernas, as bicicletas e as carroças dos caseiros.
ResponderEliminarAbraço e saúde
Eu fui meio/meio, só aos 10 anos é que fui para uma escola mais longe e tive de ir de transporte, antes podia ir a pé e preferia
Eliminarum abraço, obrigada e muita saúde
Nunca me lembro de ser magrinha, mas invisível lembro-me várias vezes!!!!
ResponderEliminarEm filas de autocarro, no bar da escola...
E talvez tenhamos andado no mesmo trólei ou autocarro, as duas invisíveis na fila :)
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