Em Lisboa prendem os jardins e há árvores a crescer
cercadas em passeios.
O pai disse-lhe que o esperasse “a tua avó em criança
brincou aqui no jardim da Estrela.”
Não consegue imaginar a avó criança. Ontem ainda
deu-lhe um beijo com a merenda.
Com o vento a abanar folhas e ramos parece que as
árvores falam, mas não percebe o que dizem.
Está frio e não vê mais ninguém. E se o pai não volta?
Dormiu na casa da vizinha. Parecida com a da avó, o
mesmo chão com tábuas compridas a rangerem sob os seus pés, mobílias pesadas e
retratos em naperons, mas das fotografias preto-e-branco são outras caras
desconhecidas que o espreitam.
Da manhã chegou lá o pai, mas quase não o reconheceu.
O pai disse-lhe para meter na mala tudo o que quisesse
trazer que ali já não voltavam.
Estava no recreio da escola quando vieram chamá-lo.
A professora, com uma voz diferente, baixa e
hesitante: “a tua avó, a tua avó...” Completou a funcionária atrás dela
“ficou-se”. Continuou a professora, “está com a tua mãe agora”.
Mas a mãe morreu quando nasci.
Não tenho mais ninguém. Então nem se lembrou do pai, a
voz ao telefone pelo Natal e nos seus anos: porta-te bem, obedece à avó.
Vieram para Lisboa para o enterro.
Ele ao lado do pai, durante a missa e depois. A avó ia
para a mesma campa da mãe. Pensou que iria ver o corpo desta, mas de lá tiraram
ossos que colocaram no caixão, para ficarem as duas juntas. Será que a avó se
importa? Morta já não parecia ela.
Tem frio e medo de chorar até que vê que o pai regressa.
Algo no seu andar lembra-lhe o da avó.
- E agora pai?
- Agora vens comigo para França.
Sem comentários:
Enviar um comentário