E se chove?
Mirou desconfiada o céu
cinzento. Hesitou em arriscar-se a sair por momentos. Precisava mesmo de sair.
Tinha a despensa vazia e no frigorifico que passara a armário apenas meio limão
esverdeado. Já nem era tanto imaginar que as paredes do estômago se colavam,
mas sentir-se tonta de fraca que se via.
Talvez a mercearia da
esquina estivesse aberta. Não teria de andar muito.
Decidiu sair, bem encasacada,
a mão esquerda a agarrar forte a pega do guarda-chuva enorme. Este serviu-lhe
quase de bengala, a sublinhar os passos, enquanto a ponta batia no chão, em
pedregulhos ou na terra. Contornou os buracos antigos e os novos. Não fazia nem
ideia se alguma vez o pavimento seria reparado e a chuva intensa fora criativa,
aumentara também os antigos. Felizmente levara galochas, se errasse um passo,
chapinharia tudo à volta, mas não ficaria encharcada, como já lhe acontecera.
Ao virar a rua percebeu
que a mercearia não abrira, nem ia abrir mais. No lugar onde antes se situava,
o rés do chão de um prédio baixo, apenas se viam escombros. Já devia ter
sucedido há algum tempo. Espreitou e pareceu-lhe ver cor. Com cuidado avançou,
levantou duas ou três tábuas, serviu-se do guarda-chuva para confirmar primeiro
que o chão era seguro e não se iria abater sob os seus pés. Estava certa,
deparou com algumas batatas e cebolas que espreitavam dum saco. Alguém as
colocara ali e depois por alguma razão não as levara. Trouxe o saco para junto
do peito e regressou depressa a casa.
Tivera sorte e não
chovera.
Se ao menos a maldita
guerra terminasse.
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