MEDO
Não é real,
não é real, não é real.
O perigo
sê-lo-ia, mas nem sequer estou neste momento em perigo.
O medo poderia
servir para que fugisse e evitasse o perigo. Em tempos, criança ainda, fugi de
perigos não reais como cães que ladravam e não mordiam e uma consulta no dentista
– ia fazer-me doer, sei que ía.
Desconfio que perante um perigo real agora ficaria paralizada, o coração a explodir
no peito – qual tambor, vão ouvi-lo,
a respiração alterada, a transpiração gelada a colar-me a roupa ao corpo, a procurar
ver no escuro, ouvir e traduzir cada ruido.
Senti-o uma
vez, saía de um pesadelo, já não estava bem a dormir, despertava, mas não me
conseguia mexer ou gritar, a paralisia do sono. Na transição entre o sono e a
vigília, a temporária desconexão das funções motoras, perceptivas, emocionais
ou cognitivas. Assustador até lembrar.
Enquanto
não me surge a minha morte como iminente, esgotado o prazo de validade, tenho
tanto medo das perdas.
O maior
medo é então sobrar apenas eu. Quem saberá quem sou, quem me ajudará a levantar
se cair? Deverei manter-me viva e só, com maleitas e doenças no corpo cada vez
mais frágil, esquecimentos e incapacidades de compreensão. Terei medo de sair à
rua, mesmo para comprar alimentos. Numa queda pode vir dor e mais incapacidade.
Pedidos de auxílio irão embater na indiferença e pressa, irão gritar-me, como
se não ouvisse bem, quando só não perceberei o que me dizem. Para os estranhos
não sou ninguém.
Manter-me-ei
viva porque só eu lembro os que me eram queridos e partiram.
Então será mais
forte o medo que a morte seja o fim porque não haverá reencontros, mas sendo o
fim, o nada, pelo menos ao morrer, acaba o medo.
htpps://soniafs.blogspot.com
ResponderEliminarÉ o sentimento mais forte que o ser humano experimenta na vida.
Com tantas notícias e imagens terríveis da guerra também me parece que pode ser a raiva
ResponderEliminarum beijinho e bom fim-de-semana