segunda-feira, março 30, 2020

Post 7403 - CNEC 48/20 - 3/10 A Professora





Gémea da feiticeira da Branca Neve, não da bruxa, mas da rainha madrasta, na beleza e severidade. Não sorria, não revelava qualquer enternecimento pelas ervilhas a seu cargo. A sala dividida para a 1ª e para a 2ª classes, num Colégio de Padres, reguadas permitidas, e a ameaça de ser levado ao sério-severo Padre-director para os reincidentes impenitentes.
Não tive infantil, por minha culpa – com dois anos insistiu a Educadora que poderia ficar com a minha irmã de cinco. Desatei num choro mal me vi abandonada. Deixou‑me à porta para dar a aula e fechei-os à chave na sala. Um aluno herói teve de pular pela janela para os libertar. Na saída, a Educadora concordou com a minha mãe, eu era muito pequena.
Aos seis, estava entusiasmada com a primeira classe. Finalmente ia aprender a ler e a escrever: pá, pé, piu, pua, pipa, pópó, pai e papá, a tia, tua tia, titi, a tia tapa o pote.
Aventuras sucessivas e intensidade face ao hoje descolorido, mas serão mais fáceis os dias com menos variações.
No então, castigava a Professora cada erro do ditado com uma reguada. Na sala o Nuno triste levava às vezes vinte, o Mário sorridente, nenhuma.
Ensinou-me a Paula como escapar à hora da tabuada. Já sabia até à dos cinco, mas seria uma aventura. Era só preciso antes pedir para ir à casa de banho. Pedimos as duas, fugimos as duas. Enganámos a bruxa-feiticeira, mas lá fora, sozinhas, nada acontecia.
Talvez fosse só professora, rodeada de bruxinhos alunos, barulhentos, infantis, a repetirem os erros uns dos outros, ano após ano, monotonia e cinzentismo, não era o que esperara, feiticeira desencantada.
Com ela aprendi a escrever e a ler, primeiro as legendas na televisão, depois os livros, os cinco e os sete e todos os outros.

  

6 comentários:

  1. Gostei de ler. Antigamente era assim. Ainda me lembro das palavras da minha mãe quando me entregou à professora.
    "Aqui está a rapariga para aprender a ler. Se ela for preguiçosa ou mal educada, chegue-lhe a roupa ao pêlo. Desde que não lhe parta algum braço, só se perdem as que caem no chão".
    Isto em 1954.
    Abraço e saúde

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  2. eu vi, num quiosque do metro do Rato, expostos e para venda, os nossos livros de leitura da primeira à terceira classe. Várias vezes pensei em comprar os que me faltam (sei que tenho um). E não é que, em casa, sempre me esqueci de ir ver qual já era meu? Lá estarão, talvez, À minha espera quando o covid se escafeder.
    Com todas as suas vicissitudes, adorei a escola primária. Foi muito interessante.

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  3. Há professores que marcam, nem sempre por boas razões...

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  4. Neste caso apesar do texto foi uma óptima 1ª classe - não tinha com que comparar e não fui vítima das reguadas embora ficasse com pena dos da 2ª classe que tinham erros nos ditados - depois passei para a Oficial e tive uma professora mais simpática

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