Queria
encontrar o amor e procurava-o na perfeição. Não se apercebia, nem se
importaria, com os corações despedaçados que ia deixando pelo caminho. O
objecto do seu interesse cedo se tornava um aborrecimento. Deitava-se com uma
deusa, acordava com uma mulher, de quem então só via os defeitos.
A certa
altura deixou-se deslumbrar por uma conservadora e marcaram encontro no Museu.
Enquanto esperava por ela, vagueara pelas salas, e num canto, meio escondida, descobrira-a.
Esculpida em mármore rosa, quase da sua altura, a sua beleza deixara-o sem
palavras. Tudo nela era perfeição, as feições simétricas, a proporção no seu
corpo. Em pé, a olhar para baixo, parecia aguardar. Tão viva que quase
esperaria ouvir a suave respiração, o arfar do seu alvo peito, um pestanejar
que a levasse a erguer o rosto e a vê‑lo. Eis quando fora surpreendido pela jovem do seu
encontro. Dir-se-ia que tinha ficado com ciúmes porque praticamente o arrastou
dali. Dormiram juntos só naquela noite. De manhã, disse-lhe
que não queria mais vê‑la.
Começou
então a sua obsessão. Foi ao Museu nos dias seguintes procura‑la. Parecia que a
escondiam, mudando-a de onde antes estava.
Um dia,
conseguiu encontrá-la numa sala vazia. Aproximou-se com cuidado, transpôs o
círculo que a rodeava, levantou um braço em direcção ao seu belo rosto e
tocou-lhe. Sentiu frio, o gelo que dela vinha, e percebeu. Não iria conseguir
despertá-la. A perfeição da sua beleza esculpida e imortalizada no mármore, era
de pedra, tão indiferente a ele, como ele tinha sido até àquela data, e afinal
imperfeita porque sem vida. Qualquer das mulheres com que se deitara, na
imperfeição revelada pela luz da madrugada, a suplantava, apenas por estar
viva. A vida era ilusão e decepção, medo e raiva, e o amor era ser capaz de ver
a perfeição da imperfeição.
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