segunda-feira, agosto 05, 2019

Post 7164 - Desafio de Escrita 2/10



Cheguei de noite à pequena cidade onde iria viver o próximo ano. Arrendara um apartamento pelo telefone e foi para lá que me dirigi. Como combinado, tinham deixado as chaves no segundo vaso que ladeava as escadas. A fechadura da porta cedeu com um pequeno estalido, permitindo-me a entrada. Levava uma pequena lanterna e com ela consegui aceder ao quadro eléctrico e depois aos interruptores, e fez-se luz. Ténue e amarela, revelou o que ficava para além do hall, a sala com cozinha, o pequeno quarto, com a lavandaria e o quarto de banho ao lado. Estava tão cansada que me deitei no sofá, tapei‑me com o sobretudo e adormeci.
Comecei a despertar lentamente pela estranheza do que me rodeava. Os sons e cheiros diferentes dos habituais. Abri os olhos e assustei-me. Ao meu nível, meio curvado, um homem olhava para mim. Ergui-me de supetão:
- Mas quem é você? O que faz aqui?
Não me respondeu logo. Continuou a olhar-me sem expressar qualquer emoção. Os seus olhos do azul mais claro e transparente que alguma vez vira. Então hesitantemente, e com uma voz infantil, perguntou-me:
- Tia?
- Não sou sua tia! Quem é você?
- Tião!
- Chama-se Tião?
Acenou que sim e sorriu.
Era filho dos meus vizinhos. Tinha entrado pela porta que eu deixara aberta.
Ter‑me tratado de tia foi um grande elogio por comparar-me à tia que adorava. Deu-me a mão com a confiança de uma criança, e de mãos dadas fomos à procura dos seus pais.
Encontrei nele o meu primeiro amigo na nova morada, mas a partir daí tive mais cuidado em trancar a porta.

2 comentários:

  1. Um conto encantador... e que como sempre, nos prende e nos surpreende, até ao fim!...
    Gostei imenso! Beijinho
    Ana

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