quinta-feira, julho 25, 2019

Post 7156 - Desafio de Escrita 1/10



 Casais
Esperam os dois no corredor. Cada um com o seu advogado. Não se olham, nem falam um com ou outro.
Ela pensa, pelo menos ele não trouxe para aqui a outra. Ele põe-se a imaginar se ela já terá arranjado alguém e essa ideia aborrece-o.
Os seus advogados são jovens.
Ele tem uma advogada, morena, com aspecto seguro e competente. Ela, um advogado um pouco mais velho, com um ar apaziguador. Ambos terminaram há pouco o estágio, embora não se conhecessem por serem de faculdades e cidades diferentes. O advogado dela tinha proposto que conversassem antes. Ela respondera que nem pensar, que ele tinha de pagar pelo que fizera. Mesmo assim e por sua iniciativa, o seu advogado combinou um encontro com a colega. No dia marcado, apenas a colega. O cliente também se recusara a vir. Já conhecia a mulher, dissera, com ela não havia acordos.
Foram os dois tomar um café. "Que chatice, terem faltado, com um pouco de boa vontade isto resolvia-se bem", comentara ele. Ela perguntara-lhe em que acordo estava a pensar. Ele que não pensara em nenhum, encolhera os ombros. Dali tinham passado para outros temas. O curso, as dificuldades em estabelecerem-se. Tinham marcado um jantar e depois outro.
Entretanto, a funcionária veio chamá-los. Conduziu-os ao gabinete do Sr. Juiz. Lá dentro, este de pé, aguardava-os e cumprimentou-os. Fala-lhes da conversão para o mútuo. "Podem ficar já hoje divorciados" anuncia-lhes para os convencer. "E sem ser preciso passarem por um julgamento público, no qual tenham de debater a vossa intimidade". Ele acha boa ideia. Ela não. Não pensa na sua intimidade, pensa só em expôr a dele. Apontá-lo como o marido adúltero, que não cumpriu os votos sagrados. Não há acordo. O processo deve pois prosseguir.
O advogado espera que vão haver mais jantares.

Ou


Uma história de tribunais 
Quando estava a iniciar o meu estágio, um Advogado mais velho contou-me uma história dos tribunais.
Um juiz já com alguma idade exasperava-se por encontrar em sucessivos julgamentos de acidentes de viação a mesma testemunha.
Vez após vez, o mesmo senhor, com alguma idade, mas atento e expressivo, comparecia às audiências para contar o que vira dos acidentes.
Tudo na área da comarca do tribunal, em zonas diferentes, carros, condutores e demais intervenientes distintos, mas a mesma testemunha.
A certa altura, convenceu-se o juiz que seria era um grande mentiroso, talvez contratado pelo advogado ou pela parte que o indicavam para depor, porque era impossível que pudesse assistir a tantos acidentes.
Preocupado com a forma como o iria expor, numa noite de chuva em que regressava a casa, já tarde, apanhou óleo na estrada e perdeu o controle do seu carro.
Despistou-se o juiz, mas depois de um peão conseguiu dominar o veículo e regressar à sua mão. Quando respirava de alívio assistiu incrédulo ao despiste do carro que vinha no sentido contrário e veio embater no seu.
Naqueles segundos o tempo pareceu suspender-se. Teve a consciência de como era inevitável a colisão e sentiu e ouviu depois o crash, o empurrão no seu carro, o puxão do cinto de segurança, o rebentar do airbag, a compressão no seu peito que o protegeu dos vidros partidos, o cheiro estranho que depois ficou no ar.
Meio combalido conseguiu sair do seu carro.
Sentiu então que alguém lhe tocava no braço gentilmente.
Virou-se e era a testemunha, o senhor de alguma idade. Estava ali e tinha visto o que se passara.
Era afinal verdade que por coincidência e por morar na zona, assistira a tantos acidentes.
E o advogado passou a recorrer à história quando se levantavam suspeições de uma sua testemunha.




10 comentários:

  1. Belo desafio de escrita logo pela manhã! Gostei do primeiro...já estava a imaginar o que iria acontecer depois!!
    Abraço!

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    1. Ups, escolhi o 2º e já enviei...:(
      um abraço e obrigada

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  2. Dois interessantes e bem conseguidos desafios de escrita.
    Gostei mais do primeiro mas o segundo também é interessante.
    Abraço

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  3. Um texto repleto de interesse, do princípio ao fim!...
    Muito bem, Gábi! Gostei imenso! Beijinhos
    Ana

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