quinta-feira, novembro 29, 2018

Post 6914 - Desafio de Escrita 1/10 e 2/10 - A Chave e Sim, mãe


      Tinha acabado de passar por aquela rua enlameada e chovia copiosamente quando se pespegou à janela.
       E já escurecia, mas algo lhe chamou a atenção para que voltasse a envergar a gabardina, calçasse as galochas e fortemente agarrada ao guarda-chuva de novo saísse para enfrentar a borrasca.
     Em passos curtos, frágeis mas decididos, chegou onde pretendia, curvou-se e com a ponta dos dedos elevou da lama escura o objecto cuja ponta brilhava.
       Fora o seu prateado resplandecente que lhe chamara a atenção.
       Meio decepcionada apercebeu-se que não passava de uma pequena chave.
       Guardou-a na algibeira impermeável e trouxe-a consigo.
    Já em casa, limpou-a cuidadosamente com um lenço de papel e olhou-a com mais atenção. Era uma chave pequena, mas trabalhada, apesar de brilhante não parecia nova.                Que será que abriria?                  
        Talvez um cofre de jóias preciosas. A dama que a deixara cair estaria agora desesperada e nunca mais poderia abrir o cofre. Não mais poderia usar qualquer uma das jóias ali guardadas, o que iria entristece-la, deixá-la-ia desesperada no luto da sua vaidade, contribuiria para o seu óbito, e no epitáfio seria recordada a chave preciosa perdida…
        Mas poderia ser também a chave do cofre de um chantagista, uma alma negra que se tentara esconder ou iludir com a bela chave escolhida. Ter perdido a chave seria a libertação das suas vítimas, não mais poderia ameaçá-las com a divulgação do que escondia no cofre…excepto se rebentasse com ele.
         Enquanto divagava, deambulava pela casa e nem se apercebeu quando a porta se abriu e chegou o seu marido. Ele sacudiu o capote e logo procurou por ela, estranhando não a ter visto à janela, hábito antigo entre muitos outros que os ligavam.
       Viu-a e ao seu minúsculo achado e no seu rosto abriu-se meio-sorriso: “que sorte, encontraste a chave do correio.”


- Tens de prestar mais atenção ao que te dizem Inês…mas estás-me a ouvir?
- Sim, mãe.
- O que é que eu acabei de dizer?
- Sim, mãe
- Não me ouviste! Queres largar o Iphone? Dá-me o aqui
- Mas mãe!
- Vou ficar- te com ele até amanhã
- Não pode ser, mãe. Como é que vou falar com os meus amigos? A minha vida acabou!!!
- Prometes prestar atenção ao que te dizem?
- Sim, mãe!
- Prometes mesmo?
- Prometo, mãe!
- Bem, aqui o tens de volta, mas deixa-o quieto um bocadinho enquanto converso contigo agora,
- Sim, mãe.
- Temos de ver se precisas de roupa nova agora que o Inverno está a começar, estás a crescer de dia para dia, com doze anos pareces ter quinze, vais ser alta como o teu pai…
- Sim, mãe.
- Mas estás de novo com o Iphone…
- Não mãe, estava só a acabar uma conversa, a dizer que agora não podia falar…
- A dizer a quem?
- À Sara, à Joana e ao Gábi.
- Mas com quantos é que conversas ao mesmo tempo?
- Estávamos reunidos, mas era para estudar, mãe, claro.
- Sim, sim, estou mesmo a ver que era… E acabaste a conversa?
- Suspendi-a…Vamos então falar de roupa, preciso de um casaco, de calças e vi umas botas super giras, iguais às que a Sara tem, mas de outra cor…
- Bem, pelo menos esta conversa interessa-te…
- Interessa-me, sim, mãe, quero ser alta como o pai, mas linda como tu!
- Estás-me a dar graxa, mas resulta, vamos lá ver como são as botas de que gostas…
- Sim mãe.

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