Lembro-me
do preciso momento em que sucedeu porque estava lá fora, no jardim, sentado num
banco vermelho. Esperava pela Sofia para irmos almoçar os dois. Sentia o leve
empurrar do vento no rosto, via-o na dança de algumas folhas caídas sobre a relva,
ouvia-o no murmurar das árvores, misturado com o chilrear dos pássaros.
De
repente tudo parou.
Nada
se movia ou ouvia ao meu redor. Deixei de sentir o calor do sol. Pensei se
teria ficado surdo quando comecei a escutar o som da minha respiração, depois o
bater acelerado do coração. Ouvi passos curtos e assustados. Era a Sofia.
Estava a vir ao meu encontro quando sucedeu e também se apercebeu daquele
momento. Não sei se a alguém terá passado despercebido. Talvez.
Nós
os dois tivemos sorte. Nenhuma emoção ou sensação forte nos possuía. Ficámos
para sempre com algum apetite, mas não tínhamos dores ou comichões, raivas ou
depressões. Os desgraçados nesses estados sabem que nunca passará e que nem
sequer podem morrer. Vivem no Inferno.
Poderia
ser melhor, se estivéssemos estupidamente apaixonados e felizes. A alguns afortunados
assim aconteceu. A nós, não. E aqueles como nós procuram, até agora em vão,
percebeu o que se passou.
O
tempo parou.
Ficámos
presos no presente, todos os momentos são iguais, deixámos de ter um futuro,
começamos a esquecer o passado. Não há mais nascimentos, nem mortes. Não
envelhecemos, nem crescem as crianças. Estamos sempre iguais, inclusive nas sensações
e sentimentos.
Escrevo
para manter a ilusão do passar do tempo e continuo a ir ao mesmo jardim, a
sentar-me naquele mesmo banco vermelho.
Espero,
sem esperança, que o pesadelo acabe, que venha a revelar-se que o parar do
tempo foi apenas um intervalo, e possa voltar a sentir e a escutar o vento.
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