Naquele
dia, não estava calor nem frio.
Espreitou
pela janela. Não brilhava o sol, encoberto por nuvens acinzentadas, mas também
não chovia. As casas em redor permaneciam afiladas nos lugares onde sempre
tinham estado.
“Lentamente
instalava-se o Inverno, encurtando os dias e sombreando as ruas. Persistiam
algumas folhas caducas fragilmente agarradas a ramos despidos. Tinham já fugido
os pássaros e hibernado os ursos.”
Empancou
na última frase. Mas haveria algum urso por ali?
Por
instantes imaginou como seria um urso a percorrer a rua, grande e cinzento,
aparentemente calmo, varrendo à distância os transeuntes assustados.
Ah,
mas esquecia-se que aquele urso teria era de estar a hibernar.
Viu-o
então numa gruta, apertada e escura.
Apenas
iria sair de lá na Primavera. Então deveria estar esfomeado, e derrubaria os
caixotes de lixo à procura de comida. Talvez mordesse um turista.
Tinha
de corrigir inúmeras e infindáveis composições sobre o Inverno. Exortara os
seus alunos a serem criativos. Julgava-se e condenava-se a si próprio por não o
ter sido na escolha do tema.
Apeteciam-lhe
dias diferentes e impossíveis, mas sentia-se ao invés inexoravelmente arrastado
pelo “a vida continua.”
Não
gritava pelas suas feridas que ninguém via.
Às
vezes a dor surgia-lhe como avassaladora e inultrapassável, outras vezes não
percebia como momentaneamente a esquecia.
Pensara
ser capaz de compreender os outros, e descobrira-se autista por não aceitar que
percepcionassem a realidade de forma distinta.
Naquele
dia não queria estar preso à correcção de testes.
Contudo
retirava do seu trabalho a ilusão que a seguir teria tempo livre, quando
viessem as férias.
E
antes do Inverno, entravam no Verão, e na roda seguir-se-ia depois o Outono,
revelando-se ultimamente as estações indecisamente enroladas e confundidas.
Até
às férias sustentaria o perfil de professor, e manter-se-ia ocupado.
Depois
talvez se dissolvesse nos dias iguais e vazios.
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