Já não o via há mais de uma década quando
encontrou o seu amigo Luís. Até tinha pensado que ele tinha morrido. O Luís
veio ter consigo, à vontade, como se estivessem estado juntos no dia anterior,
e anunciou-lhe que estava atrasado para o leilão. Apesar de não saber do que
falava, seguiu-o por ruas estreitas, até um velho prédio. Subiram as escadas de
degraus de madeira inclinados e cobertos por uma tapeçaria antiga, de um vermelho
desbotado. Entraram num salão interior, onde estavam sentados dois homens e
três mulheres de idade, vestidos de escuro. O Luís disse-lhe para se sentar.
Por outra porta lateral entrou o leiloeiro.
Era alto e magro, e deu de imediato início aos lances.
Inadvertidamente levou a mão ao rosto para
abafar um espirro e apercebeu-se que sem querer tinha licitado uma obra. Não
sabia qual, mas sabia que não tinha como a pagar e quase entrou em pânico.
Um homem ao seu lado reparou e assumiu a
licitação. Quis agradecer-lhe e ele pareceu-lhe familiar. Lembrava-lhe o seu
pai, ou melhor, a si mesmo, só que mais velho.
O seu eu de mais idade virou-se então para
ele e disse‑lhe: “É a tua alma que está em jogo e pela forma como viveres a tua
vida é que poderás, ou não, ter o valor para não a perderes.”
Acordou em sobressalto no seu quarto, com
um aperto no peito, rodeado por paramédicos chamados pela mulher.
Durante algum tempo pensou se teria tido alguma
experiência de pós-morte e se seria um aviso. Teve cuidado com a saúde e com a
forma como actuava com os outros.
Depois voltou a agir como antes e até a
preocupação se foi.
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