Era
uma porta enferrujada. E ela entrou.
A
velha casa esperava-a.
Lençóis
cinzentos cobriam os poucos móveis que restavam.
Pelas
janelas emperradas a luz que entrava revelava partículas de pó suspensas no ar,
coloridas pela luminescência que reflectiam, e recortava estranhas sombras à
frente dos seus passos.
Ali
tinha sido feliz.
Fizera
seu aquele espaço, a antiga casa do caseiro, com a autorização dos tios, donos
da propriedade. Dissera-lhes que ali poderia estudar para os exames sem que as
brincadeiras dos primos, a distraíssem.
No
final da manhã com a merenda e os livros ia para lá. Talvez quisesse fazê-lo
para tornar o pretexto verdadeiro, mas não conseguia estudar. Só esperava.
Esperava
por ele, o seu primeiro – então acreditava único – amor. Quando ele chegava, o tempo
parava. Perdia-se nos seus abraços e beijos, cada vez mais íntimos e
inebriantes.
A
febre que a percorria, impediu-a de ver que cresciam as suspeitas pelas suas
estranhas ausências.
Uma tarde foram surpreendidos. Os dois enrodilhados
na cama e despidos, quando o tio e o avô entraram por ali dentro. A vergonha
deixou-a muda e ele não a ter defendido, decepcionou-a.
Voltou
corrida para a casa dos pais. Não houve mais férias na aldeia com os tios. E
cresceu.
Atrás
de si toda uma vida. Um casamento, dois filhos, um divórcio. Os avós e tios já
tinham morrido. Foi preciso tratar das partilhas e regressou à aldeia. Decidiu
ligar‑lhe. Tinha já compreendido que na altura também ele tão jovem.
Quando
ele atendeu, não lhe reconheceu a voz. Disse-lhe quem era e que queria vê-lo.
Ele ficou algum tempo em silêncio. Ela até pensou que a chamada tinha caído.
Depois combinou o encontro ali.
Tantos
anos depois, de novo esperava por ele. Sem saber se viria.
Até
que ouviu passos e eram os passos dele.
Tantos anos depois e o número do telefone dele ainda era o mesmo. Que bom!
ResponderEliminarQuem sabe a velha porta enferrujada, após ser bem lubrificada, ainda pudesse ser aberta muitas e muitas vezes?
Tomara que ela não se desiludisse. Os anos modificam tanto as pessoas...
Beijinho e parabéns pelo texto, Gábi. Gostei muito.
Pois, não tinha pensado nisso, nem como é ela se lembrava do número e tudo :)
ResponderEliminarobrigada Janita por teres lido e pelas palavras.
um beijinho