O meu avó paterno esteve na 1ª Grande Mundial. Tinha 19 anos. Esteve na frente de Lille e a sua missão era levar mensagens de bicicleta.
Quiseram promovê-lo a cabo, mas ele conseguiu evitar essa promoção, evocando não ter a 4ª classe (se fosse promovido teria de ir mesmo para a frente combater). Numa altura em que estavam a recuar, uns colegas recusaram-se a deixá-lo ficar no abrigo por estar cheio. Teve de prosseguir à procura de um outro abrigo. Os que estavam naquele primeiro abrigo foram feitos prisioneiros pelos alemães.
Quando regressou a sua namorada (noiva) não tinha esperado por ele e estava casada com outro. Ele casou com a irmã mais nova dela.
Foi gaseado, o que no Inverno contribuía para que ficasse sempre doente
O meu avô materno tinha vinte e um anos quando começou a primeira Guerra Mundial, trabalhava como representante comercial e na altura fazia viagens de barco para a Madeira e para os Açores, viagens que foram restringidas.
No início da Guerra Civil em Espanha (1936-39) o meu pai tinha 11 anos. Morava em Argoselo com os seus pais e lá ouviam os tiros das batalhas travadas ao lado. Os que tentavam fugir para Portugal eram apanhados e entregues às tropas franquistas. Na pequena igreja havia ainda lugares reservados, os da família do meu pai ficavam do lado dos cristãos novos (antes pela tradição uma corda separava os dois lados, mas entretanto retiraram a corda).
O meu pai e a minha mãe tinham 14 e 7 anos quando começou a 2ª Guerra Mundial.
A minha mãe morava em Lisboa com os seus pais e andava no Colégio Alemão (nessa altura era loura e nos retratos aparece com tranças compridas). Irmãos dos seus colegas combateram e morreram (os pais de um dos seus colegas, professores no Colégio, quando o filho mais velho morreu, não vestiram luto porque o filho tinha morrido pela pátria). Quando ia a casa dos colegas com pais, ou a mãe ou o pai alemão, gostava de como eram práticas (sem os naperons e bibelots das casas portuguesas) e de beber cacau quente.
Em Lisboa, seguiam-se as instruções para pintar os vidros de azul e colocar protecções para que no caso de um bombardeamento os vidros não se partissem e entrassem para o interior das casas, ferindo os seus ocupantes.
Houve racionamento, com senhas. A minha avó tentou fazer pão, mas o resultado não foi muito feliz, saíram uns pãezinhos meio insonsos e apesar do meu avô ter dito que a culpa era do forno, não voltou a repetir a tentativa.
Surgiu um novo penteado feminino, "à refugiada", cabelo preso, em rabo de cavalo ou numa banana, ou curto, penteado pela própria, sem ir ao cabeleireiro.
Quando da 2ª Guerra Mundial, em Argoselo, não houve falta de comida. Já em Bragança, onde o meu pai foi para frequentar o liceu, passou fome.
Em Lisboa, para onde foi frequentar a universidade, foi ainda foi pior. Durante meses, na pensão em que estava, as refeições consistiam em sopa, couve e batata cozidas, e metade de uma carcaça.
Por essa altura viu muitos estrangeiros, sobretudo artistas, que tinham fugido e queriam ir para os Estados Unidos.
Uma compilação de memórias muito interessantes.
ResponderEliminarAbraço
Espero que dê para continuar a para as desenvolver.
ResponderEliminarum beijinho
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ResponderEliminarJá tens matéria para vários livros e pelo menos 3 filmes :)
ResponderEliminarEstá óptimo!!! São estas memórias que me foram roubadas há muitos, muitos anos :(
Aguardemos os capítulos seguintes.
Também achei Eira-Velha
ResponderEliminarum beijinho grande
Gábi
Diferenças: O meu trisavô era caçador de baleias. O meu bisavô combateu na 1ª guerra, em África. Um outro bisavô meu foi republicano, posteriormente comunista, esteve preso no Tarrafal. O meu pai tinha 14 anos em 1974.
ResponderEliminarNo Verão de 2000 fui com uns amigos a Cabo Verde e estivemos no Tarrafal. Deve ter sido terrível ter lá estado preso.
ResponderEliminarPareceu-me uma boa ideia começar a tentar registar estas memórias e seria engraçado descobrir por exemplo que os nossos avós, bisavós ou trisavós se poderiam ter encontrado num determinado momento histórico...
gostei de te ler...
ResponderEliminarnenhum dos meus familiares directos foi a qualquer guerra.
os meus avôs eram demasiado novos para irem à Grande Guerra Mundial e o meu pai quando começou a guerra colonial já tinha cumprido o serviço militar... até os meus tios escaparam. espera um tio meu esteve em Angola, mas como tinha trabalhado como barbeiro com o meu padrinho, nunca saiu de Luanda...
beijinho
Um compêndio curioso.
ResponderEliminarSó o meu tio materno teve que guerrear em África, mais propriamente na Guiné.
Os meus avós nunca saíram do país e sempre foram de vidas modestas.
Obrigada, Luis Eme. Acho muito interessante as histórias de familia e saber como foram vividos acontecimentos históricos.
ResponderEliminarum beijinho
Poderá haver uma história interessante ou um livro Paulofski, no que ele terá vivido na Guiné.
Pelo que ouço aos meus pais, as suas vidas e as dos meus avós eram muito diferentes e algumas bem difíceis (por exemplo o meu avô materno começou a trabalhar com 11 anos)