É tarde.
Há muito que fecharam as escolas. Todos
aqueles que vinham dos empregos nos horários ditos normais, já estão em casa.
Também os que saíram para jantar fora, somente para um café, ou para passear o
cão, regressaram aos seus respectivos lares.
Por outro lado, é demasiado cedo.
Falta ainda muito para que reabram
as escolas, se encham as ruas de carros e autocarros no sentido inverso. Mesmo
para que se liguem os fornos e se comece a cozer pão.
No centro da cidade, os edifícios perfilam-se
vazios de pessoas, ruídos e luz, divididos por ruas escuras, parcamente
iluminadas pelos candeeiros públicos, alguns avariados, outros por engano antecipadamente
desligados, porque nada anuncia ainda a madrugada.
Começa a chover, primeiro tão tenuemente
que mal se ouve, mas logo a chuva molha‑tolos e morronhenta cede lugar a uma irmã
mais vigorosa e audível.
Está sozinha no meio da praça.
Chegou lá, antes que começasse a chover, em passos rápidos como se fugisse,
empurrada pelo ar frio, sem nada que a travasse nos espaços vazios.
Sentou-se num banco de pedra.
O tumulto em que se debatia e
afundava escondido pelo semblante falsamente indiferente e marcado, perdida nos
seus pensamentos, “não sei o que fazer, não sei o que fazer”.
Até que o silêncio se impôs,
começou a pesar-lhe e assustá-la, não ver nem ouvir viva-alma.
A Praça era ladeada por velhos
carvalhos e os seus ramos despojados pareceram‑lhe braços levantados em mudas súplicas.
Quando levemente as gotas iniciais
lhe chegaram ao rosto, sentiu como se lhe lavassem a cara. Refrescaram-na
primeiro, depois sentiu-se gelada.
Tinha de sair dali.
Levantou-se hesitante. Apesar da
chuva, os seus primeiros passos foram curtos e lentos. Serviram no entanto para
que se sentisse menos dolorida e fria.
E finalmente decidiu, “vou deixá-lo,
para ele não volto mais”.
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