Um
homem está sentado em frente à televisão. Janta os restos de uma feijoada que
trouxe do almoço, enquanto segue sem interesse um programa transmitido em directo.
Os apresentadores, volta-e-meia, interpelam a audiência pedindo aplausos.
A
câmara centra-se no público que aplaude e varre as filas ao fundo. Vêem-se muitas
senhoras de idade presas em sorrisos enquanto batem as palmas das mãos. Pelo
canto do olho algo lhe chama a atenção. Pára de mastigar, levanta-se e
aproxima-se da televisão, com o comando recua e pausa na imagem que lhe
interessa.
É
a Aurora!
Conheceu-a
há três anos numa festa do bairro. Soube logo que ela era a tal.
Não
conseguiu foi que ela o percebesse. Convenceu-a a dar-lhe o número de telefone,
mas não o anotou bem, quando ligou era o de um talho. Inúmeras vezes voltou
àquele bairro, que não era o dele, sempre em vão. Também não devia ser o dela.
E
agora ali estava. Um pouco mais velha e redonda, mas era a Aurora.
Engoliu
o pedaço de comida que tinha atravessado e precipitou-se para a porta, levando
o casaco e as chaves do carro. Para lá, parou apenas numa bomba de gasolina.
Não tinham flores, nem chocolates. Comprou-lhe um grande pacote de bolachas.
Chegou ao estúdio ainda com tempo. Ficou cá fora, à espera.
Fumou
um cigarro entre olhadelas ansiosas ao relógio.
Eis
que começam todos a sair. Vê-a e grita: “Aurora!”
Ela
não parece reconhecer o nome, talvez tenha começado a ficar surda.
Pára
à frente dela, forçando-a a parar, grita mais alto: “Aurora!”
-
Mas está-me a confundir, chamo-me Ana!
-
Uma rosa com outro nome não teria o mesmo perfume?
-
Cale-se com isso que tenho de apanhar o metro.
Deixou-o
com o coração partido e levou as bolachas.
Talvez
não fosse ela.
Uma delícia esta história sobre os desencontros do amor :)
ResponderEliminarUm beijinho, Gábi
Muito obrigada pelas palavras Miss Smile
ResponderEliminarum beijinho
Gábi