sexta-feira, novembro 15, 2019

Post 7254 - Campeonato de Escrita 6/10




Quando vi que eras tu, fiz de conta que não te via.
Eras-me ao mesmo tempo estranha e familiar.
Lembravas-me de mim mesma, uma versão minha inexpressiva e envelhecida.
Ao longo dos anos, tenho evitado pensar em ti. Talvez por isso pensei que não te temia.
Pensei que te daria as boas-vindas, mas fui cobarde. Nada de repousar eternamente, quando contemplei ao invés, o nada.
Ainda não, queria dizer-te, ainda não.
Pensei que recusaria tratamentos e cirurgias, que não os suportaria para ganhar mais alguns momentos.
Enganei-me.
Consegui que recuasses, sabendo que voltarás.
O que faço agora quando não posso mais enganar-me?
Ainda viva, mas apodrecida, não sou nada, não fiz nada, de mim nada restará e arrasto‑me, morta-viva e derrotada, até que regresses.


1 comentário:

  1. Não há como evitar o passar do tempo... um dia teremos que nos enfrentar, com a nossa versão mais envelhecida... e aceitá-la... é a melhor forma, de não a acharmos tão má quanto isso... e com o espírito mais leve... certamente ainda nos restará alguns interesses... e algo que ainda possamos fazer...
    Mais um belíssimo texto, que nos deixa a reflectir! Beijinhos
    Ana

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