sexta-feira, abril 28, 2017

Post 6180 Livros 2017 (72) A Terra Prometida de Ernesto Contreras

A Terra Prometida de Ernesto Contreras
Colecção Miniatura, Livros do Brasil, nº 148
Título original: La Tierra Prometida (1967)


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Ilustração para a capa
Guache de Infante Do Carmo


O autor, Ernesto Contreras nasceu em 1930, em Tétuan, Marrocos, mas desde 1936 passou a residir em Alicante que considerava a sua cidade, onde morreu em 1993. Autodidacta, teve vários trabalhos. Casou e teve quatro filhos. Escreveu também, El Paseo y otros relatos (1961) e Un dia de este invierno (1962) livros de contos, Suburbios del Hombre (1957), Interior con Figuras (1961) e Huías al mar (1964), livros de poesia (nesta obra terá "conseguido a sua maior expressão poética, própria de um espírito mediterrâneo para quem a realidade, ao cantá-la ou contá-la toma formas que redimem da tristeza." "La tristeza navega a ningúm sitio" diz no seu verso final. Ver aqui 
"La tarde rueda sobre las palmeras
tenaz y lenta, arrastra los recuerdos.
No es fácil olvidar que fuimos tristes
hombres, durante siglos, dulces sueños
derrocados, cadenas de costumbres
Vivir, vivir mientras rueda la tarde."

Sobre o livro:
Esteban filho de Beltrá regressa à sua terra Falconer, em Alicante, de onde saiu em jovem, e à qual não voltou mais, até agora, depois de ter estado nas trincheiras e ter construído outra vida em França com a loira Michèle.
Reencontra a tia e madrinha Virtudes, Maria, que para ele e para os amigos, tinha sido a rapariga mais formosa da região, e tem agora uma filha Marieta, o amigo de infância Victorino, e Iniesta, responsável pela morte do pai, por o ter denunciado.

O autor escreve imensamente bem, pelas descrições, imagens, poesia, criação de personagens e vidas que me surgiram como tão reais. Acompanho-o neste regresso e surpreendo-me com um desenvolvimento que não previ. Continuando a narrativa após este desenvolvimento consigo perceber melhor o título do livro e a forma como termina.
Gostei muito deste livro (comecei agora a pensar em viagem a Espanha para encontrar outros livros do mesmo autor).

Pág. 7 e 8:
"Ao amanhecer, o chiar de um carro eléctrico acordou-me. Voltou-me, como um eco, a sensação de que regressava, e acudiram-me em tropel todas as imagens da viagem. Imagens confusas, como as dos contornos dos móveis, como a luz suja que ensombrava o quarto, deslumbrando-me todavia. Ou como os ruídos sonolentos e o cheiro a mar que entravam pela janela aberta.
Estive alguns minutos a olhar a janela, creio que assombrado. Esperava ver alguma coisa por ela, talvez a copa de uma palmeira, apesar de estar convencido de não haver palmeiras para aquele lado da cidade. Olhei com assombro, mas só descobri aquela claridade opaca do amanhecer, enturvando as cortinas brancas.
Deitei a mão ao relógio na mesa de cabeceira. Eram cinco horas. O autocarro não saía antes das sete, mas eu sabia bem que não poderia voltar a dormir, e levantei-me. Saí da cama sem pressa, tentando dominar os meus sentimentos, gozar a emoção a que me entregara desde o próprio instante em que decidira a viagem. No entanto, algo se mantinha confuso, como as primeiras imagens a seguir ao chiar do carro eléctrico. Realmente dormira pouco, nem talvez três horas, e, apesar da emoção, sentia sono. Sentia-o sobretudo na aspereza da língua e no ardor dos olhos.
Ao aproximar-me da janela, o cheiro a mar fez-se mais penetrante e os ruídos da rua chegaram até mim isolados. límpidos. Duas pessoas estiveram por instantes a falar debaixo da janela e ouvi os seus passos afastarem-se, enquanto, distintas, soavam as pancadas de uma bengala. Logo a seguir, o ruído de uma bicicleta, a respiração rítmica das locomotivas e, novamente, o chiar de um carro eléctrico. Era um amanhecer na cidade como eu o  havia imaginado e que me pareceu estranhamente familiar."

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