Maria
de Fátima, vinte e dois anos, não consegue arranjar trabalho, não tem dinheiro
para a renda atrasada do quarto, nem amigos que lhe emprestem ou família que a
acolha.
Os
seus pais foram lavradores sem grande apego aos filhos. A vida dura secava‑lhes
os corações.
Ainda
mal andava, mandaram-na para a casa da avó Maria e aí pela primeira vez teve
colo. Ela fez-lhe uma boneca de trapos e tratava-a por cachopa.
Uma
manhã, a avó não acordou. Morreu de velhice.
De
regresso a casa dos pais, só parava quando dormia. Ainda não havia luz começava
na labuta, na terra e na casa, todo o dia.
O
pai foi para fora trabalhar numa quinta. Cedo veio a triste notícia:
mandaram-no serrar uma árvore, meio ensonado e mal ensinado, não cuidou para
onde caía. Morreu de acidente
Já
tinha onze anos, a mãe decidiu que ia servir na cidade.
No
primeiro emprego enquanto limpava a casa, lavava a roupa e cosia, fazia
companhia à Clara, a filha dos senhores. Uma professora vinha dar-lhe as lições
a casa. Fátima também aprendia. Liam as duas os romances de cordel que a
cozinheira trazia. Muito branca e magra, Clara nunca saía de casa. Sempre
cansada, queria esconder da mãe a roupa suja do sangue que tossia. Saiu por fim
de casa mas para o Sanatório e não voltou mais. Morreu de doença, tísica.
Novos
patrões: a senhora, ríspida e ciumenta e o marido que de dia ignorava-a, de
noite visitava-a. Deixou de vir, quando lhe vieram as primeiras regras.
Pela
dor e vergonha que sentira nunca quis namorados.
Passou
os anos a limpar as casas dos outros.
Adoeceu
e perdeu o emprego.
Com
os últimos tostões comprou lixívia.
Sabia
que a ninguém fazia falta, ninguém sequer a conhecia.
Morreu
da indiferença em agonia.
Morrer de Indiferença... quase parece um prémio para uma vida toda ela marcada pela indiferença... mas existem muitas vidas exactamente assim... marcada pela indiferença...
ResponderEliminarUma história que dá que pensar... pois a luta diária de cada um, também passa por não se tornar indiferente... aos olhos dos demais...
Beijinhos
Ana
Escrevi o texto para um desafio de escrita, mas não gostei muito do que escrevi, prefiro finais felizes e esta minha personagem pouca felicidade parece ter tido.
ResponderEliminarum beijinho