sexta-feira, setembro 04, 2015

Post 5067 - A Fotografia - 1ª tentativa

Lembrava-se pouco da tia-avó Bárbara. 
Baptizaram-na com o seu nome e viu-a algumas vezes quando era criança. Nessas visitas, encontrava uma velhinha meio alheada do que se passava à sua volta, mas que às vezes a olhava com carinho e lhe oferecia chocolates brancos. 
Contaram-lhe que tinha ficado afectada com a morte do noivo num acidente. Foi sabendo que cada vez se isolava mais na casa de família até que morreu.
Ficou surpreendida quando soube que no testamento lhe deixara tudo. Pensou que teria sido por ter o seu nome que a elegeu como herdeira entre vários sobrinhos.
Esperou pelas férias para fazer a viagem da capital até à vila e ir ver o casarão. Cheio de pó, com as mobílias cobertas por lençóis, correspondia um pouco às suas recordações. Algumas salas pareceram-lhes mais pequenas, os móveis antigos não escondiam as marcas do uso ao longo do tempo.
Tinha de decidir se o iria vender e resolveu primeiro escolher o que poderia guardar ou até oferecer aos primos para os apaziguar.
Não encontrou nada de valor ou pessoal no rés-do-chão e 1º andar. Subiu até ao sótão, pela primeira vez. Ao contrário do que antecipara era um espaço agradável, com muita luz, um sofá perto de uma estante, num recanto que convidava à leitura, e uma arca ao lado. Dentro desta encontrou uma velha caixa de cartão, abriu-a, e descobriu cartas enlaçadas por uma fita vermelha, fotografias antigas, ainda a preto e branco, conchas e flores secas. Olhou com atenção para as fotografias, recordações de familiares e momentos que não tinha vivido, até que uma lhe chamou a atenção. Nesta reconheceu a tia-avó, quando jovem, meio abraçada a um homem que olhava sorridente para quem os fotografava. A tia estava mais a olhar para ele, revelando o enleio e a paixão que sentia. Seria sem dúvida o seu noivo. Fixou-se mais nele e surpreendeu-se por as suas feições lhe lembrarem alguém familiar. Os olhos bondosos, o sorriso aberto, eram os do seu pai.
Então percebeu. No passado, seria muito difícil a uma mulher sozinha, devastada pelo desgosto, tomar conta de uma criança. Ou porque não estava em si com a dor, ou porque aqueles que sempre pensara serem seus avós o tinham querido, abdicara do filho.
Percebeu que a sua tia era na verdade sua avó e era essa a razão para ter o seu nome e ser sua herdeira.

3 comentários:

  1. Muito bonito !! Parece muito real . Gostei :))

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  2. Um belo conto, Gábi ! ... Estás uma verdadeira escritora !
    Esse é para concorrer, como já tens feito ? ...
    :))

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  3. Obrigada Marizei :)
    um beijinho



    Obrigada Rui :) é para um concurso diferente, dez textos, este é o oitavo, e até agora, estou em 19º em 80 (mas alguns dos 80 não enviaram todos os textos)
    um beijinho

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