quinta-feira, abril 18, 2013

Biscoitos de limão - 1ª tentativa - Pecado A Gula

400 gramas de farinha de trigo
200 gramas de manteiga
100 gramas de açúcar
1 ovo
raspa de 2 limões

Mistura-se tudo, amassando-se muito bem, formam-se os biscoitos, em laços entrelaçados que vão depois ao forno pré-aquecido, num tabuleiro polvilhado com mais farinha, por cerca de vinte minutos, até ficarem dourados.

Podem-se comer ainda quentes, acabados de fazer, num final de tarde de Outono, com a luz a desaparecer enquanto o sol se põe, alaranjando os biscoitos. Ou na manhã seguinte, com chá ou café, antes de se sair porta-fora, e podem vir connosco cuidadosamente embrulhados a aguardarem um intervalo na hora do almoço, ou ficarem à nossa espera em casa, acentuando a noite em limão.

Quantos pode uma mulher com um metro e cinquenta, acima do peso, comer por dia? Um tabuleiro com vinte ou trinta. Depois dois tabuleiros e arranjar de seguida tabuleiros maiores.
Catarina, loura, branca e baixinha. Olhos grandes de mel e uma paixão pelos doces e bolos. Nunca teve um namorado. Aos vinte anos, confidente das amigas, pareciam-lhe todos um pouco tolos. As amigas a quererem viver grandes romances, a passarem sucessivamente por fases repetidas. Animação. Ele é mesmo giro não é? A rirem das piadas dele sem graça. Paixão. Não existe mais ninguém no mundo. Deixava de as ver, chegavam atrasadas aos espaçados encontros. Decepção. Afinal, ele é um parvalhão. Nem sabes o que me fez. Arranjou outra. Também já não o queria para nada. Não tinha conversa. Um egoísta que só queria ir ao jogo com os amigos. Arrependimento. Será que ele me vai ligar? Será que eu devia ligar-lhe? Depressão. Só quero ficar em casa a dormir. Recuperação. Catarina, vamos sair? 
Até aparecer o próximo.
Com ela, não. Encontrava-se com as amigas, ria-se com elas das aventuras que lhe contavam, ouvia-as e tentava consolá-las e desistira de lhes falar no ciclo que se repetia. 
Ela preferia os biscoitos de limão. Ou os bolos de chocolate, as bolas de berlim e os pastéis de nata.
Um belo dia apareceu-lhe o Pedro. Padeiro, com curso de pasteleiro. Falaram de receitas. Marcaram encontros. Ele trazia-lhe os bolos que criava para ela experimentar. Começou a aguardar ansiosamente pelos seus encontros. Pensou se estaria apaixonada. Negou a si mesma que não seria a mesma coisa se ele viesse sem doces. Juntaram receitas de bolos e casaram. Ele gostava de a ver comer com tanto apetite. Em alguns anos, dobrou o peso. Havia mais dela para ele amar. Não conseguiu engravidar. O médico sugeriu uma pequena dieta, mas ela nem quis ouvir falar disso. Foi logo para casa, e encontrou consolo num pudim francês. Até que um dia a Sílvia a chamou para uma conversa. Tinha que lhe abrir os olhos. Não tinha ainda desconfiado das horas extra que ultimamente o Pedro arranjava? Ele tinha outra. Uma magrela que nem devia gostar de bolos. A Elsa deslavada que também andara atrás de um namorado da Sílvia, mas ela tinha-o posto logo com dono, e calçara-lhe depois uns patins.
Ela não disse nada. A Sílvia e outras amigas condoeram-se dela, comentaram como se mostrava corajosa. Debateram entre elas o que deveria fazer. Falar ou não com o Pedro. Terminar o casamento ou ignorar e esperar que lhe passasse. Podia ser a crise dos quarenta.
Ela continuou sem nada dizer e para si, pensou, não sinto nada. Depois imaginou como seria se o Pedro se fosse embora. Ocorreu-lhe que assim não iria mais cozinhar para ela, acabariam os bolos e pudins. Tinha de fazer alguma coisa! Durante alguns dias quase se esqueceu de comer, até que encontrou a solução. Ligou à Elsa. Disse-lhe que sabia o que se passava, marcou uma conversa no parque, ao final da tarde e pediu-lhe segredo. Dia de Inverno, às dezoito horas, parecia já noite e por ali não se via viva alma. Chegou primeiro e quando viu a Elsa, confirmou com ela que não falara a ninguém do encontro. Depois foi muito rápida. A Elsa não devia pesar nem quarenta quilos. Deitou-se para cima dela e abafou-a com o seu peso. Quando a sentiu inerte, arrastou-a para debaixo de uma velha árvore. Colocou-a à frente desta como se tivesse tropeçado nas raízes retorcidas e caído. Regressou a casa. No dia seguinte, o Pedro chegou mais cedo e fez biscoitos.

21 comentários:

  1. Mas que criatividade!
    Boa solução para se livrar da magrela!:-))

    Abraço

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  2. Prefiro "Biscoitos de polvilho"...:)
    Mas gostei da trama mefistofélica, originalidade na arquitetura do assassinato, bem lemmon, e o estímulo às pessoas que são abastadas em quilos...

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  3. Provavelmente ela não conhecia as raivas...
    :)

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  4. Obrigada Rosa dos Ventos :)
    um beijinho




    Hum, tenho de experimentar esses biscoitos de polvilho :)
    Obrigada Hesseherre :)
    um beijinho




    E eu que já conheci umas mesmo boas, devia ter-me lembrado delas, Rui Pascoal :)
    um beijinho

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  5. A gente passa aqui, tem uma receita de biscoitos e um crime à espera.
    Que mais se pode pedir se o protagonista até se chama Pedro? :))
    Bjs e votos de bfds

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  6. Muito bom... já para não falar dos biscoitos de limão :)

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  7. Não me lembrei dos Pedros que poderia conhecer, quando escolhi o nome, Pedro Coimbra :)
    obrigada, um beijinho e bom fim-de-semana



    Obrigada, Catarina :)
    um beijinho e bom fim-de-semana



    Obrigada, Marizei :)
    um beijinho e bom fim-de-semana



    Obrigada, luisa :)...não sei se a receita funciona...
    um beijinho e bom fim-de-semana

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  8. Não conheço os restantes mas acho que a Dona Redonda devia ganhar!

    Bom fim-de-semana!

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  9. Obrigada Numa de Letra :)
    um beijinho e bom fim-de-semana

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  10. As mulheres são o diabo...
    Gostei!
    Beijinho

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  11. Obrigada Eira-Velha :)
    um beijinho e bom fim-de-semana

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  12. Adorei! bastante criativo, humor um bocadinho 'noir'.
    Vai correr bem de certeza! Numa próxima colectânea talvez me entusiasme e também participe...parece ser uma boa forma de estimular a escrita de ficção.
    Parabéns!

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  13. Obrigada Tétisq :) Não queres tentar esta? O prazo só termina no dia 30 de Abril...
    um beijinho

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